terça-feira, 30 de agosto de 2011

Rapidinhas candangas

A melhor época do ano para visitar Brasília, na minha opinião, é justamente nos meses de outono e inverno. A estiagem garante dias lindíssimos, de céu aberto, como na foto acima. Para driblar o tempo seco, basta levar no bolso um bom protetor labial e passar creme hidratante no rosto antes de dormir. Para marcar meu batismo brasiliense, nada mais típico do que uma autêntica passeata do MST. Ainda bem que a Esplanada dos Ministérios tem espaço de sobra, com oito faixas - o que significa um transtorno bem menor do que o das manifestações na apertada Av. Paulista. O turismo cívico é facinho de fazer: os prédios oficiais ficam próximos uns aos outros, e alguns oferecem visitas guiadas (para quem não estiver de bermuda, é claro). A decepção fica por conta da rampa do Palácio do Planalto, menor e menos glamourosa do que se supõe pela TV. O grande barato de Brasília é mesmo o projeto urbanístico do Plano Piloto. Os prédios, todos com 3 ou 6 andares, mostram como a contenção da verticalização deixa uma cidade muito mais agradável. A organização em superquadras é, no mínimo, curiosa. Não dá pra não se sentir em uma versão king size do campus da USP. Como as quadras são em geral parecidas entre si, a sugestão para o turista é visitar a 308 Sul, que serviu de modelo para as demais. Ela é enfeitada pela Igrejinha N. Sra. de Fátima, com desenho de Oscar Niemeyer e azulejos de Athos Bulcão, que rendem um ótimo pano de fundo para retratos. Mesmo se você não for muito chegado em igrejas, não deixe de visitar a Catedral Metropolitana, também desenhada por Niemeyer, e o Santuário Dom Bosco, com seus vitrais azuis. Não confundir com a minúscula Ermida Dom Bosco, um pequeno monumento erguido num terraço às margens do Lago Paranoá, com uma bela vista. Tecnicamente falando, o Distrito Federal não contém cidades, e sim regiões administrativas. Isso quer dizer que Brasília e as cidades-satélite vizinhas não têm eleições para prefeito - seus administradores são nomeados diretamente pelo governador do DF. Ou seja, quando a população elege um governador corrupto, ela se ferra duas vezes. As cidades-satélite têm uma cara completamente diferente do Plano Piloto. O noticiário nacional destaca sempre as mais pobres, como Ceilândia e Paranoá, essa última um cenário propício para quem curte um amor bandido. Mas há algumas com expressiva classe média, caso de Águas Claras, cujo boom desordenado de prédios altíssimos lembra um Tatuapé em construção. O brasiliense médio fala com sotaque capixaba, tem conta no Banco do Brasil mesmo se não for servidor público (pois ali há 8 agências do BB para cada 2,5 da concorrência) e ficou blasé com a escolha da capital federal para receber jogos da Copa. Ele considera os goianos meio jecas e provincianos, e é tido como carudo e esnobe por eles. Se há um lugar adequado para empinar o nariz logo pela manhã, é a pâtisserie do Daniel Briand, na 104 Sul, que serve saladas, quiches e doces franceses. O truque para não se sentir lesado pelos preços é dividir entre duas pessoas um único café-da-manhã completo (Première Formule, R$29), e pedir à parte a bebida extra do seu acompanhante. Tenho que admitir que os pães são realmente incríveis. Os chefs mais badalados de Brasília são a Mara Alcamim e o Dudu Camargo, cada um com seu pequeno império gastronômico (ela comanda três casas e ele, seis). Eu estava prestes a escolher um deles para o jantar de sexta, mas meus amigos locais sopraram no meu ouvido que a comida de ambos era meio overrated e não estava à altura dos preços praticados. Não desisti deles, mas deixei para a próxima. E minha escolha não poderia ter sido melhor: Taypá, um digno representante da onda neoperuana que tem varrido o mundo. Comecei com um ceviche nikkey (salmão, abacate, leite de coco, molho de ostras e teriaki) e emendei um salmón novoandino (recheado de risoto de quinua, camarão, champignons e molho teriaki). Adorei tudo e pretendo voltar. Outra surpresa foi o Nossa Cozinha, um bistrô minúsculo, escondido no lado residencial da 402 Norte. Lugar charmoso, preços honestos, serviço atencioso (os próprios donos vêm falar com a freguesia) e uma das melhores cheesecakes que já comi. Outra guloseima digna de nota é o famoso sorvete de pistache da Saborella, com textura aveludada e sabor doce na medida. O precinho é bem brasiliense: R$11 por uma bola, R$106 por um quilo. Foi bem legal voltar ao Pontão do Lago Sul e ver aquilo fervendo em um lindo domingo de sol. O corredor gastronômico à beira do Paranoá ficou maior, com a chegada de filiais da rede carioca Devassa e do japonês ocidentalizado Soho, aquele mesmo de Salvador. Acabei conferindo o tradicional Bier Fass, que só valeu pelo cenário e pelas boas companhias: a comida, mediana, demorou inexplicáveis 80 minutos para chegar à mesa. Outras dicas: o italiano Villa Tevere, os peixes do Coco Bambu, o mexicano El Paso, o sushi do Kojima, o bife à parmegiana do Panelinha, as pizzas da Valentina, o vegetariano Naturetto, os sucos e wraps do Bendito Suco, os bolos da Casa dos Biscoitos Mineiros e, para uma extravagância maior, os menus fechados do Aquavit, que giram entre R$140 e R$192/pessoa. Quando o assunto é noite gay, o circuito brasiliense não chega a emocionar - Goiânia está bem melhor na fita. Entre os bares, o tradicional Beirute só satisfaz aquele público desencanado de boteco; já o Savana, que teoricamente seria a opção mais arrumadinha, precisa melhorar em tudo, do ambiente à cozinha. E a Blue Space, principal boate da cidade, fica num lugar simplesmente horroroso. Por isso, não é de se admirar que as label parties sejam aguardadas e vividas tão intensamente. No sábado, o fiel público da Fun! dançou até 10 da manhã, e muitos ainda continuaram a jogação em um chillout. Se a locação não contribuiu (era a Blue em si), os go-go boys eram deslumbrantes e o som me surpreendeu. Daniel Mendes fez um warm up ao mesmo tempo chique e acessível, conquistando a pista sem fazer concessões, e Grá Ferreira mostrou um som de festa totalmente seguro de si, digno de atração principal, com direito a versão de "Heart of Glass", do Blondie. As novas esperanças da noite repousam nos meninos do site Parou Tudo. Eles já abriram o Glow Lounge, um espaço multiuso que tem reunido os bonitos da cidade às quintas, e se unirão a Lili Santana, da festa que leva seu nome, para fundar um novo clube. O lugar se chamará Victoria Haus e preencherá a lacuna deixada pela Blue Space, que fechará as portas em breve, ainda bem. Quando for pedir sua vodquinha, muito cuidado: circula pela noite de Brasília um bizarro energético de garrafão que só pode ser coisa do Demo. Tomei menos de duas doses e não consegui pregar o olho por quase 24 horas. E quando o assunto é pegação, as bees brasilienses já estão plugadíssimas no aplicativo Grindr, com seus perfis mula-sem-cabeça. Se você prefere mais fibra e menos laquê, os cafuçus do cerrado frequentam uma certa sauna em Taguatinga, fica a dica. Só não vi mesmo o tal entardecer vermelho/laranja/roxo que aparecia em várias fotos de Brasília. Vai ver que isso era coisa da Embratur se jogando no Photoshop. Mas não há de ser nada. Fui tão bem recebido e conheci tantas pessoas legais, que já estou fazendo planos de voltar. E quem sabe dar uma esticadinha até Pirinópolis e mesmo Goiânia, que tem sido cada vez mais recomendada!

11 comentários:

Laisa Beatris disse...

Tão completo que nem parece que você passou só o fim de semana por lá!

Diógenes disse...

R$11 por uma bola de sorvete? AH VÁ!
Gente, fico PASMO como somos provincianos..

Sil disse...

Querido, seu comentário é informativo até para quem mora aqui na capital. Dicas muito fiés à realidade. Quanto ao entardecer, garanto que não é photoshop. Quando podemos, paramos tudo para assistir. Volte para verificar. beijo.

Fernando disse...

1) Energético de Garrafão? Brasilienses: esse é o TFsomenumber? Cara, energético de garrafão RULES: eu tomava um no meu intercâmbio na Alemanha que era dessa potência!

2) Fofo o seu post. Prova total de que não importa a cidade que você visite, gostar ou não sempre depende do teu empenho em conhecer coisas legais.

3) Recalque de carioca: mas então, qual é a sua capital/ex-capital brasileira preferida? :D

Beijos,
Acho que os brasilienses se sentirão orgulhosos desse post,
Fer

Thiago Lasco disse...

Laisa: Eu fiquei em Brasília de quinta a domingo. Mas sempre ajuda o fato de que faço uma boa pesquisa prévia antes de sair de casa, isso acaba otimizando meu tempo no destino!

Diógenes: Pois é. Em 2009, fiquei mais chocado ainda, pois no mesmo Daniel Briand gastei R$45 para comer um crepe com uma xícara de chocolate quente. Desta vez, já vim preparado psicologicamente. Brasília é caríssima, talvez porque todo mundo tem salariozão de funcionário público. Mas de lá pra cá, São Paulo encareceu tanto, mas tanto, que desta vez achei os preços das duas cidades até que bem compatíveis. Infelizmente.

Sílvia: Obrigado pela visita! Na verdade o tal mítico entardecer tinha sido minha razão número 1 para voltar. Vi o por-do-sol com o máximo de boa vontade, o céu estava limpinho da silva, mas... não ficou nem rosadinho :)

Fernando: Eu não vi se tinha marca, é um garrafão que ficava aberto no bar da Blue Space e eles completavam. Quando comentei com os meus amigos, eles responderam: "Deve ser o Mamute". Nada mais apropriado. E o meu ranking de capitais favoritas não mudou: São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Curitiba! :)

Daniel Cassus disse...

Mad Dog?

Foroni disse...

Cara, como vc consegue isso? Sério, como vc consegue fazer um retrato totalmente atualizado e muito informativo sobre um lugar que vc mal conhece e no qual ficou poucos dias??? Por favor, me ensinaaa! rs

Tiago disse...

Concordo com a Sílvia: eles existem mesmo, só não acontecem todo dia. Como traballho até as 19h, não costumo ver, mas uns amigos postaram umas fotos bem bonitas esse ano. Espero que da próxima você tenha mais sorte!
E, a propósito, o Nossa Cozinha fica na 402 norte.
Beijos! Adoramos a visita!

beto disse...

Eu diria que na parte turística e/ou badalação Brasília se encaixa naquelas cidades para serem visitadas 1x só, no máximo 2x.

Mas tudo muda quando se conhece pessoas que são ótima companhia. Dei essa sorte em BSB tb; aí a viagem passa a ser para rever amigos e não de "turismo".

E, mesmo não sendo bem seu foco, a apenas 200km de BSB está a Chapada dos Veadeiros, um lugar espetacular para passeios na natureza.

K. disse...

De Brasília, juro que minha lembrança mais vívida é: "mas gente, no avião tinha tanta gente bonita... cadê??? fizeram só escala???"

Brincadeira... mas a cidade do oscar não podia deixar de ser o que ele é: chata e quadrada. Paisagem péssima... oh arquitetura desgraçada!

já o povo que conheci é bem legal! =D

Anônimo disse...

onde vc conhceu seus amigos brasilienses? sou do PR e conheci vc ( thiago) em SC (FERIAS DE AMBOS)e garanto dificil nao gostar de vc, além de educado e inteligente,é um charme sua timidez!