segunda-feira, 14 de julho de 2008

O insensível corte da guilhotina

Sites de encontros do tipo Disponível, Gaydar e Manhunt podem ser uma mão na roda para quem quer conhecer gente nova. Há quem ainda insista em ver a coisa de forma meio estigmatizada, como se paquerar na internet fosse coisa de perdedores ou menos aceitável do que caçar na The Week, numa sauna ou no Central Park. Bobagem: quem escreve e acessa os perfis são as mesmas pessoas de carne e osso que flanam pelo mundo real, embora ali algumas dêem uma "carregada na maquiagem". Como em tantas outras situações, a internet só facilita as coisas - pensem em quem mora numa cidade pequena ou, por qualquer motivo, não pode se expor publicamente para saciar suas necessidades sexuais e afetivas.

No meu caso, acho bastante prático fazer a linha "vinde a mim": deixo os perfis online para quem quiser ver, vou fazer outras coisas e, quando volto, é só ver as mensagens dos interessados que estão me esperando. O desgaste é zero e a comodidade não poderia ser maior: você se coloca na vitrine, mas quem se expõe primeiro é o outro, que toma a iniciativa. A você, cabe a confortável decisão de abrir a porta ou simplesmente soar o gongo.

Até aí, tudo muito trivial, provavelmente a grande maioria dos meus leitores sabe bem como a coisa funciona. Depois de um tempo, você assimila as regras do jogo e ele flui sozinho. O lance é que, de uns tempos para cá, comecei a questionar justamente as coisas que para mim sempre foram meio automáticas. Eu recebo uma quantidade mais do que razoável de mensagens todo dia (ou melhor, todos os dias em que fico online). A grande maioria delas, eu descarto de imediato. Não são necessários mais do que cinco segundos para eu acessar o perfil do remetente, formar uma opinião e emitir meu veredito binário: serve ou não serve. E tchau. Próximo.

É claro que existem casos em que o perfil em questão fornece indícios - ou mesmo provas - de que o dono não combina comigo. Escrever não é um dom de todos, mas isso não me faz perdoar marmanjos crescidos que usam o miguxês. Ou o gerúndio. E o jargão de bofe? Completamente desnecessário, brother - na hora de engatar uma terceira, o miado não tardará. Mas os piores são aqueles que estão exatamente dentro do que você não quer, mas ainda assim escrevem, porque não se deram o trabalho de ler o seu perfil primeiro. Gente assim não precisa de uma resposta.

Mas não é esse tipo de eliminação que eu questiono. O buraco é bem mais embaixo: falo de outros que não tinham nada de desabonador, mas ainda assim acabaram no paredão. O fato é que, se o cara não tem uma entre três ou quatro qualidades que me instigam e que eu convencionei achar "sexualmente interessantes", ele não tem graça nenhuma e, portanto, não merece o meu tempo. Não compensa interromper a procura para ouvir o que ele pode ter a me dizer. "Dar chance"? Para quê? Chance é para quem você acha que tem chance.

Quem está no jogo adquire um senso crítico implacável. Uma olhadela de relance numa foto qualquer já é suficiente para que se formem sobre aquele pretendente suposições que adquirem peso de verdades. É nerd. É surfistinha. É pagodeiro reformado. Usa cueca da Adventure. Não tem pegada. Dubla horrores. Não sabe beijar. É meloso. Tem amigos varzeanos. É muito paradão. Meio burrinho. Será que uma imagem diz tanto assim sobre uma pessoa?

Mantive meus perfis online, mas nunca deixei de viver e circular em ambientes reais. E foram essas vivências fora da rede que me fizeram começar a repensar os valores que eu sempre pratiquei virtualmente. No dia-a-dia, em rodinhas de amigos, em situações absolutamente insuspeitas, despretensiosas e sem a menor conotação sexual, conheci e conversei com muita gente diferente que passou pelo meu caminho. E tive algumas surpresas. Pessoas para quem eu não daria a menor bola na internet se revelaram ótimas companhias. De diversas formas. Com bom-humor, com doçura, com inteligência. Ou com uma boa dose de safadeza. Virtudes que as tornaram interessantes - e, em alguns casos, acabaram despertando meu interesse. Algumas até me pegaram de jeito. Gente para quem eu não daria "nada"...

E é isso que tem me levado a olhar para trás e fazer a seguinte indagação: será que todos aqueles que chegaram junto e foram bacanas comigo mereciam mesmo ir para a guilhotina, sem mais nem menos? Será que não tinham mesmo nada de bom a oferecer? Em geral, eles tiveram meu silêncio como resposta. Mas com alguns eu quis ser simpático e respondi, agradecendo e dizendo que nossos perfis não batiam. Como eu sabia que não tínhamos absolutamente nada para trocar? Será que não fui ainda mais antipático dando essa resposta a eles? Por que uma pessoa simplesmente "não serve", será que ela não serve pra nada? As pessoas têm tanta coisa a mostrar além da primeira camada de verniz!

Continuo acessando meus perfis e ficando online na vitrine. E mesmo depois dessas reflexões, ainda descarto a maioria, sem dar explicações. Mas agora sempre me ocorre que posso estar desperdiçando a chance de conhecer alguém que poderia me surpreender. E é isso que tem me feito pensar em desistir da internet. No fundo, ela sempre será palco de julgamentos primários - porque você não se sente estimulado a ir além se não tiver um chamariz imediato (da imagem) muito convincente. Já no mundo real, a pessoa tem a chance de ser e mostrar muito mais, e até de virar a mesa com uma boa conversa, um pouco de jogo de cintura e presença de espírito. Na internet, ela é só mais um perfil, uma entre tantas páginas a serem viradas - por mim e por outras pessoas. Afinal, algo me diz que eu não sou o único que age dessa maneira.

20 comentários:

كَارْلُوسْ - Ashraf disse...

Eu conheço ou não conheço esta história?
Já vi ou não vi isto acontecendo?
Com quem será?
Já tens minhas respostas.
Dê uma olhada em meu último post.
Deverá te agradar.
Have a nice trip, friend.

poor guy fashion victim disse...

Caso tenha interesse especial por este tema leia manuel castells, que apesar de focalizar o impacto da internet na economia e na politica, também aborda as relações interpessoais, provocadas pela sociedade em rede.

Sendo a obra dele muito extensa, existe um livro pequenino, tipo entrevista, com o título como algo "conversas com manuel castells" em que os principais pontos do seu pensamento são abordados.

http://poorguyfashionvictim.blogspot.com

Paulo disse...

Fala, meu amigo! Você não é o único não... Já desci a guilhotina várias vezes, e em pelo menos duas vezes eu tive a chance de conhecer a pessoa descartada em carne e osso. Bom, nem preciso falar que me arrependi amargamente de tê-las esnobado antes, e claro que elas deram o troco depois, fazendo o mesmo comigo... fazer o quê!

Ultimamente os perfis virtuais diminuiram bem, resultado de uma crise moral de alguns meses atrás... Ficou só orkut e gaydar, já tá de bom tamanho!!


abração!

Too-Tsie disse...

Cada um tem o seu modo de operar esse jogo delicioso de caça & caçador.

Eu sabia peneirar bem como você, a gente toma muita base em experiências passadas, que pode ser um erro né? O tal pré-julgamento. Os que ainda me instigavam um pouco, eu dava a tal chance.

Mas não se martirize por isso, eu acho que sorte e destino andam conosco nessa empreitada.

Estefanio disse...

Acho que o fato é o jeito e o que é mostrado! Na pegação da internet pouca coisa eh mostrada e dessa pouca coisa menos ainda eh verdade, isso se torna mais passivel de avaliações e julgamentos!
Mas se for pensar, o q eh uma foto e umas poucas informações de um perfil, contra um toque, um olhar, uma pequena atitude do aovivo?

Anônimo disse...

ok, me dê uma chance!!!,Eu te convido para um almoço ou um jantar pra tentar te seduzir, pois eu estou procurando justamente alguém com seu perfil!!! (aprovado ou quilhotinado???)Adorei, beijo Márcio G.

tommie carioca disse...

Sugiro vc botar no perfil assim: "Me surpreenda, me faça não te escolher nem te rejeitar apenas por suas fotos". Um amigo, desencantado com esses sites, colocou "estou saindo, nao encontrei um amor aqui". Pronto, choveu mensagem de gente com papo bem melhor do que antes. Mas não acredito em regras, e sim em (pré)disposição.

Anônimo disse...

Pois é, esse é o problema da paquera virtual, o que parece simples na verdade não é bem assim. Fazemos julgamentos muito apressados e nos irritamos quando tomamos a iniciativa e o outro dá uma resposta mal-educada ou sequer responde? Penso: quem é ele para me tratar assim? Se ele me conhecesse não faria isso... mas no fundo é o que todos fazemos. É que depois de "aceitar" o contato, tem que ter um papo básico (onde vários já são guilhotinados), aí tem que marcar um encontro, rola aquela preguiça de sair (principalmente nesse frio), chegar naquela situação meio esdrúxula, inventar uma conversa... enfim, o que parece simples acaba ficando muito complicado. Não é que nos contatos ao vivo não role também uma guilhotina, mas acho que ela é menos implacável.

Celso Dossi disse...

Acho que nem tanto pela internet, mas mais pelos sites em questão.
Não tem muito o que explicar alí, é feito pra ser rápido e direto ao ponto.
Conheço até casos que viraram namoro, mas, geralmente, o intuíto é séquiço.
Se quer conhecer alguém pela net pra conhecer qualidades e tal, sugiro o Facebook e suas applications.

Anônimo disse...

MUITO BOM ESSE POST. EXATAMENTE O QUE FAZEMOS. EU TAMBÉM QUESTIONO O VALOR DESSES SITES DE ENCONTROS COMO FORMA DE CONHECER PESSOAS. NÃO FAÇO UM JULGAMENTO MORAL, MAS OS QUESTIONO JUSTAMENTE PELA FACILIDADE QUE NOS LEVAM A JULGAMENTOS RÁPIDOS SOBRE PESSOAS E IGUALMENTE RÁPIDAS ELIMINAÇÕES. E, DOS ENCONTROS QUE TIVE, NENHUM DEU CERTO, CRIAMOS EXPECTATIVAS QUE NA HORA H NÃO SE REALIZAM. NÃO TEM JEITO, PARA MIM ACHO QUE SÓ FUNCIONA MESMO O CONHECER NO MUNDO REAL.

Anônimo disse...

Será que a internet não reproduz a vida real? Quando você escreve Já no mundo real, a pessoa tem a chance de ser e mostrar muito mais, e até de virar a mesa com uma boa conversa, um pouco de jogo de cintura e presença de espírito. Na internet, ela é só mais um perfil, uma entre tantas páginas a serem viradas - por mim e por outras pessoas., acho que falta acrescentar o seguinte: a oportunidade da pessoa se mostrar com uma boa conversa se dá quando ela é apresentada ou simplesmente integra um círculo social comum, paralelo ou com pontos específicos de intersecção. Ou ela foi trazida por alguém que já conhecemos, ou ela esteve sempre lá, mas oculta pela desatenção, ou ela por algum acaso ou intenção gradativamente foi tomando espaço próprio, mas sempre tendo uma porta de entrada que não é autônoma. Não fosse assim, não se veria tanta gente voando sozinha pelas pistas ou se esforçando pra uma oportunidade: ninguém conversa, ninguém dá conversa. Outro agravante: será que só se escolhe? Não se é escolhido? Afinal, há quem reserve seu próprio universo a quem dê mostras de merecer adentrá-lo, que apenas se movimente na mesma intensidade e em contrapartida ao esforço percebido. O fato é que hoje há muito rodeio e muito carão entrecortados por pouquíssima conversa e abertura mesmo quando se diz que o foco mira numa amizade não necessariamente apimentada, com ou sem expectativa de que se converta em algo muito maior, muito além de uma mera noitada, tampouco em mais um novo contato pra se cumprimentar por aí. Pra variar, outro ótimo post. Parabéns e abraço!

Antonio disse...

é..., passo por uma situação parecida ao mudar esse ano de facul e de cidade! como é dificil uma primeira aproximação(ainda mais para os tímidos como eu), várias pessoas dividindo espaços coletivos e nem um olhar de cumplicidade rola...
só lamento pela perda de tempo e, como vc disse, pela perda de oportunidade de conhecer alguém bacana!
Adorei o texto!
:)

Anônimo disse...

Acho que chats e sites de relacionamento nao merecem ser estigmatizados pelo tipo de pessoa que esta atras do nickname ou perfil, mas talvez (talvez!) pelo comportamento delas quando estao no mundo virtual. A dinamica que se convencionou estabelecer ali e diferente, mais instantanea e superficial. E por isso, possivelmente menos estimulante e reveladora.
ABS!

Douglas FR disse...

Então, quando eu era um fedelho de 17 anos, descobri o tal do Disponível. Fiz o perfil. Infringindo a lei, imaginem! Depois de três meses, excluí a conta e nunca mais voltei.
O assédio até que era grande, mas só vinham pessoas desinteressantes e sedentas por sexo. Como era muito novo, fiquei assustado com os lobos (sim, a grande maioria era de tiozão). Os caras simplesmente não liam o perfil, atentando para detalhes elementares.
Comecei a ficar de bode e abandonei a conta de vez.
Tenho vários amigos com perfis nos três sites citados e eles adoram, se divertem horrores. Uns são bem seletivos, já outros... Enfim, vai de como cada um gerencia e o que procura exatamente.

Gurizão disse...

Isso não é um problema só seu... eu já fiz isso várias vezes e como eu tenho um perfil bem seco, já passei por isso... mas o melhor é vc ver a pessoa na balada, a pessoa chegar em vc e vc se fazer de doido... to the left :) mas cada um tem que fazer sua publicidade da melhor forma que quer vender seu peixe... eu uso esses perfis pra conhecer pessoa, rolar amizade e depois algo mais... se a pessoa só quer sexo, tem que saber vender a proposta né?

Bjaozaoooo

Unknown disse...

Você já se questionou se as suas exigências e expectativas não estão altas demais?

Ou talvez, falte paciência.

No campo da "carne" o que não falta é oferta e claro, demanda. E nada impede que se saia entrando de "vitrine" em vitrine" atirando para todos os lados....uma hora, vai que o perfil bate? E talvez seja assim que esses caram operam.

Beijão e saudades

Jôka P. disse...

Não conhecia nada disso, vai ver que é por isso que estou sozinho e vivo reclamando de solidão. Vou lá olhar e quem sabe me inscrever nesses sites de gente disponível como eu.
Valeu a dica. Abç!

CÓDIGO SECRETO disse...

Gostei muito do seu blog;
voltarei outras vezes;


abraços Código Secreto

Anônimo disse...

Cara, muito legal teu blog... o descobri há pouco, fussando a respeito de BsAs, q to indo agora dia 29, próximo! Aliás, colocarei em prática várias de suas dicas da cidade portenha. Mas bem, além de te elogiar, escrevo pra saber o que é o tal "miguxês" desse teu texto, até pra saber se naum cometo o tal... hehe
Abraço,
kako_poa@hotmail.com

Anônimo disse...

cara meu contato é kaco com "c"e não kako, como postei hj à tarde!
vlw,
abraçao