quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Moby para quem precisa

E eis que, com alguns aninhos de atraso (ele poderia ter vindo nas turnês dos discos anteriores Play e 18), o Brasil finalmente recebeu Moby em seus palcos.

Nesses tempos em que rótulos se fundem e rock e eletrônica se cruzam promiscuamente, um show de Moby era uma incógnita, especialmente para quem não assistira a nenhum de seus DVDs. Outros nomes da eletrônica, quando tocaram ao vivo no Brasil, acabaram tendo que adaptar suas músicas para o palco, em releituras que, mesmo dotadas de valor artístico, desvirtuaram um bocado as faixas e frustraram a expectativa dos fãs que, em última análise, estavam lá para dançar. Os hits do Groove Armada perderam muito de seu poder dançante no show no Autódromo de Interlagos, no Skol Beats de 2002; o duo Chemical Brothers, mesmo apelando para os sintetizadores, num misto de live PA e bases pré-gravadas, só convenceu porque agregou à sua apresentação toda uma parafernália visual, com telões e efeitos que criaram um verdadeiro "videoclipe ao ar livre", mascarando a performance apenas mediana de seu som.

E Moby ? Moby trouxe uma banda nitidamente profissional e muito bem entrosada entre si, e deu ao público o que ele queria: um apanhado dos hits de sua carreira, desde a jurássica "Go"(1993), egressa de um tempo em que a eletrônica como a conhecemos apenas engatinhava, até "Lift Me Up", faixa de trabalho de seu álbum mais recente, o irregular Hotel.

O curioso é que as faixas funcionaram muito bem no palco sem que fossem necessárias grandes adaptações em seus arranjos - tirando a substituição da base eletrônica por um baterista (nova-iorquino filho de mãe paulistana e uma graça, diga-se) e um ou outro solinho de guitarra que não se fazia ouvir nas faixas de estúdio, pouca coisa foi mexida. Ao vivo, as canções convenceram ao ponto de em alguns momentos a gente esquecer que "Moby" não é uma banda, e sim um produtor de música eletrônica.

Isso foi conseqüência não só da insuspeita vocação rocker de músicas como "Bodyrock", que fez o público pular e bater cabeça como nos idos da febre grunge, como também da inclusão de algumas covers algo inusitadas, como "Sweet Child O'Mine" (Guns N'Roses), numa versão meiga com sabor de karaokê romântico, "Creep" (Radiohead), que poderia muito bem ser a história de vida do próprio Moby, um esquisitão por natureza, e "Break On Through" (The Doors), executada com competência pelo guitarrista num momento do show em que Moby deixou que cada integrante de sua banda fizesse um número próprio para mostrar suas habilidades.

O público mostrou que já tinha assimilado bem o trabalho do produtor, cantando em uníssono inclusive as letras de algumas faixas que não tiveram tanto destaque em sua carreira. Desnecessário dizer que em "Natural Blues", "Why Does My Heart Feel So Bad" e sobretudo "Porcelain", carros-chefe do multiplatinado disco Play, o mal-produzido Espaço das Américas quase veio abaixo, dando aos artistas a certeza de sua consagração em solo brasileiro.

Mereceu destaque a performance da vocalista de apoio que, com sua poderosa voz de negona americana, garantiu alguns dos momentos mais emocionantes do show. Seu berreiro sarará fez toda a diferença em faixas como a vigorosa "Find My Baby", o gospel de arena "In My Heart" e a antiguinha "Feeling So Real" (do álbum Everything is Wrong), usada para encerrar o show de forma enérgica.

Em termos de atitude, Moby mostrou que não é tão tímido e introspectivo como se supunha, conseguindo sorrir e se soltar no palco, mas sua interação com a platéia foi um tanto quadradinha, com direito aos "obwrigado obwrigado" de praxe, alguns "is there anybody having fun here ?", e o apelo fácil (e discutível) de criticar o governo Bush para incitar a platéia (como se a massa adolescente que o aplaudia tivesse algum gabarito para avaliar a política externa dos EUA). Nesse sentido, quando Moby incitou os presentes a mostrar seu dedo médio para que ele pudesse tirar uma foto, me senti na platéia do Passa ou Repassa, extinto game-show televisivo apresentado por Angélica.

No fundo, num momento histórico em que até a rebeldia e o questionamento já foram pasteurizados, enlatados e digeridos pelos meios de comunicação de massa, seria demais esperar que Moby emergisse como um novo messias. Em vez disso, o moço fez um show redondinho, que agradou aos fãs ávidos por cantarolar os hits e mostrou para os desinformados que, além de ser um carequinha vestido de astronauta que não come carne, ele é um virtuoso multi-instrumentista que sabe transpor com desenvoltura os limites da música eletrônica.

(foto: Atena Kasper)

2 comentários:

Anônimo disse...

E eu me pergunto afinal de contas quem a Folha Online mandou pro show do Moby?

No mínimo, o cara só ficou na porta a ver navios [porque não deveria ter credencial ou algo do tipo] e informou-se lhufas antes de ir ao local.

Tudo bem que visão de fã é visão de fã, mas o tipo de informação que você dividiu era o mínimo que uma crítica ou reportagem decente deveria por no ar.

Mande o texto pra lá e pegue a vaga... [risos] Ótimo mesmo! "Vi e ouvi" por suas palavras.

[]
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Moby faz show esforçado, mas filas e som ruim atrapalham (http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u53640.shtml)

Anônimo disse...

Um dia ainda quero ter o seu poder de descrever, analisar e emocionar ao mesmo tempo e só com palavras.
Seu blog está aqui no topo de sites obrigatórios de se ler (e se inspirar).
Mesmo de lugares distantes nossos Mobys passaram as mesmas sensações e impressões.
Beijos, Thi! :)