Um dos tristes assuntos da semana no Brasil foi a barbaridade cometida por cinco jovens de classe alta da Barra da Tijuca, no Rio, contra uma empregada doméstica que esperava um ônibus às 4h20 da manhã. Sirlei Dias, 32 anos e um filho de 3, teve sua bolsa arrancada e levou cerca de 30 golpes, entre chutes, socos e pontapés por todo o corpo e também na cabeça e no rosto, enquanto era xingada e humilhada.
Diante do delegado, os rapazes disseram que espancaram a doméstica porque pensavam que ela era prostituta. Ah bom, agora está explicado. Investigações da polícia já descobriram que Sirlei foi apenas mais uma entre muitas vítimas da ignorância do grupo. E funcionários dos prédios onde os jovens moram disseram que eles sempre atacavam gente pela rua quando voltavam das suas baladas e chegaram a arremessar um coco (!) em um trabalhador na Avenida das Américas. Até no posto de gasolina da avenida eles já foram reconhecidos como baderneiros e violentos - segundo o gerente do posto, um deles costumava carregar duas pedras nas mãos para não ter que bater com o próprio punho no momento da briga.
Isso tudo me chocou, mas não me surpreendeu. A escrotice da molecada bem-nascida da Barra não é novidade - em 1993, Gabriel O Pensador já a cantava nos versos de "Retrato de Um Playboy". Na música, os filhinhos de papai cariocas maltratam empregadas domésticas, sacaneiam mendigos e atiram ovos em um trabalhador no ponto de ônibus (no videoclipe, os personagens descarregam um extintor de incêndio no coitado). E isso não é privilégio do Rio - os riquinhos de Brasília que atearam fogo em um índio pataxó que dormia na rua, em 1997, não me deixam mentir. Esses jovens monstros são criados dentro de feudos superprotegidos, onde só têm contato com pessoas semelhantes; com isso, não aprendem a conviver em sociedade e respeitar aqueles que são diferentes deles - sejam pobres, negros, homossexuais, nordestinos ou índios.
O que me deixou simplesmente atônito foram as declarações do Sr. Ludovico Ramalho, pai de Rubens Arruda, um dos delinqüentes: "Queria dizer à sociedade que nós, pais, não temos culpa. Não é justo manter presas crianças que estão na faculdade, estão estudando, trabalham, têm caráter. Não concordo com a prisão na Polinter, ao lado de bandidos. Vão acabar com a vida deles. Existem crimes piores (!). Peço ao juiz que dê uma chance para cuidarmos dos nossos filhos".
Vamos entender: o pai crê piamente que não tem nenhuma responsabilidade pelas atitudes do filho. E, mais ainda, não acha justo que ele seja punido pelo crime que cometeu. E isso porque ele "não é bandido" - bandidos são os pobres que superlotam as celas da Polinter; o filho dele não, ele tem "caráter", pois é um "garoto de família". Uma família que não deu limites para o filho e agora, depois que ele deixou um rastro de várias vítimas, quer "cuidar dele".
Que me desculpe o Sr. Ludovico, mas a chance de cuidar do filho e educá-lo ele já teve. E foi incapaz de dar conta dela: não o ensinou a agir com civilidade e, pelo que mostram suas infelizes declarações, é mais um dos que acreditam que as leis e os deveres não são os mesmos para todos e não valem para quem tem dinheiro. Se Rubens e os quatro outros adolescentes foram capazes de cometer essas atrocidades, muito disso se deve à visão de mundo que aprenderam dentro de casa. Isso vai ficando mais evidente a cada vez que o Sr. Ludovico abre a boca para defender o filho: "Sirlei é mais frágil por ser mulher, por isso fica roxa com apenas uma encostada. O homem é mais resistente". Já deu pra perceber a quem Rubens puxou?
Ao contrário do que alega o Sr. Ludovico, os cinco marginais da Barra da Tijuca não são mais "crianças" (tanto é que espancaram Sirlei como gente grande) e precisam ser punidos com rigor. Para que aprendam, finalmente, que seus atos têm conseqüências. E para que os muitos outros Rubens, Leonardos, Rodrigos, Felippes e Júlios que perambulam em seus carros zero pela Barra da Tijuca, pelo Plano Piloto ou por Alphaville aprendam que não são pessoas superiores aos alvos que perseguem - e não estão acima das leis que valem para o resto da sociedade.
domingo, 1 de julho de 2007
Ricos, covardes e acima da lei
Postado por Thiago Lasco às 10:56 AM
Marcadores: brasil, comportamento, sociedade
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11 comentários:
Thi,
Adorei o post! Pra variar o melhor texto que li sobre o assunto até agora! bjus (cris)
Gostei do que li. Acredito que é um reflexo do que ocorre na maior parte das cidades brasileiras. Aqui, em São Paulo, semanalmente vemos e ouvimos histórias não menos ultrajantes que ocorrem com gays, negros, mendigos, mulheres...enfim, os agressores se colocam como os protetores da sociedade contra a escória humana. No entanto, fica a pergunta: será que a polícia vai conseguir nos proteger contra esse novos Hitlers??
Excelente post.
Olá,
Cheguei por acaso e gostei do seu blog. Quanto ao post, o "Sr. Ludovico" parece ser pior do que o próprio filho: além de tutor, provavelmente está acostumado em bater em mulheres, porém com mais "suavidade", para não marcar. Ele deveria era ter ficado calado!
Parabéns pelo blog. Gostei bastante.
Um abração!
ótimo post!
Muito bom o post.
Não acredito que os jovens ficarão presos, os advogados vão dar um jeitinho. Se ficarem, solto rojões. É preciso dar exemplo.
comentei levemente isso no meu blog tmb. acho que dentro da cabeça de gente com um mínimo de bom senso, educação e valor humano isso é difícil demais de entender. são pessoas em quem apostamos tanto sobre a mudança do nosso país, mas essa aposta e mudança são pra serem positivas...
abraco
Belíssimo texto, de uma maturidade incrível. Ainda mais para alguém tão novinho quanto você - parabéns. Está muito melhor, por exemplo, do que o do André Petry que saiu na "Veja" desta semana. Você é o futuro da imprensa brasileira.
Essa filosofia de crianças idealizadas, sem exposição a decepções, sem palmadas, sem cobranças, que precisam ter TUDO o q os amiguinhos têm, etc, tem criado esses monstrinhos adolescentes e mesmo adultos.
Thiago,
as vezes paro e tento imaginar para que mundo estamos caminhando. Tá difícil de descobrir.
Isso tudo é uma barbaridade. O pior, é que já estamos nos acostumando, parece que nos anestesia e não nos assustamos mais com uma notícia desta. É grave.
Nesta madrugada, um jovem foi agredido com uma barra de ferro por outros 4 adolescentes, quando saía de uma casa noturna, na Lagoa.
O pior, foram liberados após o pai de um deles, conseguir entrar em contato com o tenete do corpo de bombeiros.
Lastimável.
Muito bom seu texto precisava eu ter esta facilidade de expor ideias parabens !
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