quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Circuit Festival, tintim por tintim

Verdadeiras maratonas da jogação, as chamadas circuit parties nasceram e se consolidaram na América do Norte, que todos os anos espera ansiosamente por eventos como a Black & Blue (Montreal) e a White Party (Miami). Já na Europa, esse formato não tem a mesma tradição: só foi introduzido em 2005, ano de estréia do LoveBall, que teve edições em Bruxelas e Barcelona.

Neste ano, o LoveBall chegou à sua quinta edição e ganhou um concorrente à altura: o Circuit Festival. Ambos foram realizados em Barcelona e chegaram a ter eventos simultâneos durante 4 dias. No entanto, as festas principais foram estrategicamente distribuídas em sábados diferentes (um cuidado que os produtores cariocas, em eterna guerra de egos, poderiam tomar).

Escolhi Barcelona porque meu primeiro contato com a cidade me fascinou e eu queria me aprofundar nela. Mas já sabia dos festivais e resolvi unir o útil ao agradável. Dentro desse propósito, de combinar turismo e jogação sem que um sacrificasse o outro, fiz uma seleção de cinco festas do Circuit e me joguei. Aqui vão minhas impressões...

1) DEVOTION
Quando: terça, 5 de agosto de 2008, 23h-5h
Onde: Sala Apolo, Barcelona
DJs: Yuri (IT), Antoine 909 (FR) e Enrico Arghentini (IT)
O que: a festa de abertura do Circuit Festival foi realizada na tradicional Sala Apolo, antigo salão de baile com galerias forradas de veludo e bares com balcão em madeira. O palco foi ocupado por uma grande caravela, com a mesa do DJ na popa e dançarinos e go-go boys na proa e no convés.
Uau: havia festas mais importantes nas noites seguintes (sem contar que o LoveBall ainda estava rolando). Mesmo assim, a Devotion bombou e deu uma ótima prévia do que seria o Circuit: um festival de homens lindos, esculturais e cheios de vontade de se divertir.
Uó: a Sala Apolo podia ser cheia de glórias e tradições, mas era totalmente inadequada para um evento desse tipo: não havia nenhum tipo de ventilação e o calor era insuportável. Com calças e bermudas grudadas no corpo, as pessoas se abanavam com guardanapos e arfavam em busca de ar. Não agüentei mais do que 45 minutos e fui embora, chocado com tamanho desrespeito. Se fosse no Brasil, o povo daria o maior basfond e o produtor ficaria queimado para sempre.
Nota deste blog: 3,0 para não ser azedo

WATER PARK
Quando: sexta, 8 de agosto de 2008, 10h-22h
Onde: Parc Aquàtic Illa Fantasía, Vilassar de Dalt
DJs: J. Louis, Iordee, Taito Tikaro (todos do Matinée Group)
O que: um dos destaques da programação, essa day party foi feita em um grande parque aquático, cerca de 30 minutos ao norte de Barcelona. Os rapazes do Circuit e as meninas do Girlie Festival (braço lésbico do evento) ficaram em áreas separadas [quer dizer, vieram uns 4500 homens e umas 78 mulheres, o que parece confirmar que nossas amigas sapas não curtem uma boa jogação]. Para eles, a pista principal foi montada dentro de uma enorme piscina com profundidade progressiva: quem estava mais perto do enorme palco dançava fazendo hidroginástica, quem estava mais longe apenas molhava os pés.
Uau1: O Illa Fantasía tinha uma excelente estrutura, com diversas piscinas, grande variedade de tobogãs, áreas para tomar sol, bares, massagem... Da parte mais alta do terreno, tinha-se uma linda vista do balneário de Vilassar de Dalt, com o Mar Mediterrâneo ao fundo.
Uau2: O clima não poderia ser mais leve e descontraído, verão total. Quem estava na parte rasa da piscina ou do lado de fora fervia, conversava, paquerava, fazia novos amigos e reencontrava velhos conhecidos. Quem estava dentro batia pés e mãos na água, feito criança, quando a música empolgava.
Uau3: A equipe da Matinée foi a cereja do bolo. Os DJs tocaram o electrohouse alegre típico das festas do clã. Atrás deles, a mise-en-scène da produção colocou uma horda de dançarinos sarados de sungão e boné da mesma cor dançando numa arquibancada, enquanto uma abusada magricela com perucão loiro sarará balançava sua enorme cauda de sereia verde-metálica, roubando a cena. E os barmen foram escolhidos a dedo: lindos, dourados e gostosérrimos, estavam em pé de igualdade com os homens mais belos do parque.
Uó: Foi um dia divertido e alegre, mas não bafônico como prometia. Mesmo com o visual maravilhoso do parque e algumas das buneetas mais buneetas de toda a Europa, a festa não chegou aos pés de uma boa GiraSol. Muito menos daquela mágica pool party da Estação do Corpo, que entrou para a história do Rio no Carnaval 2006.
Nota deste blog: 8,0 seria bastante justo

3) TOUR INFINITA '08
Quando: sexta, 8 de agosto de 2008, 23h59-6h
Onde: DBOY, Barcelona
DJs: David Berna (ES) e Ismael Rivas (ES); Jeremy Reyes (FR), Fabio White (UK) e Francesco Belais (IT)
O que: festa organizada pelo pessoal do InfinitaMente Gay, maior festival gay de Madrid, responsável também pela parada do orgulho da capital espanhola. Eles trouxeram para a DBOY (resultado de uma caprichada repaginação da antiga boate Salvation) os dois residentes da Space of Sound, a balada mais incrível de Madrid, que acontece das 9h às 15h de domingo dentro de uma estação de trem.
Uau1: quem já teve o privilégio de passar um domingo na Space of Sound sabe que Ismael Rivas é "o" cara [já falei dele várias vezes no meu blog, mas não adianta, a The Week não o chama para tocar!]. Com um som às vezes denso e envolvente, outras vezes totalmente pra cima, ele comanda a pista com muita classe, sem jamais tocar farofa [aliás, já estou há um mês sem ouvir uma só notinha de tribal-bate-cabelo! uhu!!!]. Em Madrid o povo sempre fica passado com ele; em Barcelona não poderia ter sido diferente. Ismael arrasou.
Uau2: sabe aquela noite "ideal" dentro de um clube? Clima gostoso na pista e todo mundo envolvido pela música? A festa foi assim. Astral lá em cima, muita gente linda, o povo interagindo. A equação perfeita (não fosse a pequena ressalva logo abaixo).
Uó: a DBOY é legal. A pista principal tem bom sistema de som e ótima iluminação, com colunas centrais que acendem e teto forrado com néons que piscam e mudam de cor. Mas essa estrutura só proporciona conforto se o clube estiver operando até um certo limite de pessoas. Como tout le monde et son père resolveu se jogar lá, a festa ficou intransitável e bastante quente (e olha que o ar condicionado do lugar era bastante potente). Mas isso não fez com que deixasse de ser uma ótima noite (bastava estar com o espírito preparado).
Nota deste blog: 9,0 com um sorriso no rosto

4) CIRCUIT FESTIVAL MAIN PARTY
Quando: sábado, 9 de agosto de 2008, 23h30-6h
Onde: Pabellón Olímpico de Badalona, Badalona
DJs: Deux (David Penn & Toni Bass) e Peter Rauhofer; live acts de Ultra Naté, Coco Star e Luca G
O que: a festa principal do festival aconteceu dentro de um imenso pavilhão olímpico em um município vizinho. Ao entrar, subir as escadarias e chegar ao alto da arquibancada, a visão que se tinha era algo impactante: milhares de homens descamisados fritavam lá embaixo, na pista montada no centro do ginásio.
Uau1: O som de Peter Rauhofer é perfeito para arenas e espaços com pé-direito bem alto. Numa apresentação compacta (foram duas horas e meia de set), Peter fez o que está acostumado e deu à festa a cara de "main party" de que ela precisava. Se eu não me impressionei mais, foi porque apresentações dele tornaram-se algo bastante corriqueiro na minha vida.
Uau2: a anunciada special appearance do astro pornô François Sagat deixou a pista boquiaberta. Ele e mais dois performers de dotes igualmente descomunais (um deles, fardado) fizeram um pocket-show tão sexy, quente e intenso que Peter Rauhofer simplesmente desapareceu, reduzido a um mero tocador de música ambiente.
Uó1: se à primeira vista a grandeza do pavilhão impressionava, um olhar mais atento mostrava que não havia produção alguma: praticamente alugaram o estádio e jogaram as bichas lá dentro. Tirando o grande telão erguido atrás do DJ, o que se via era uma iluminação bastante modesta para a dimensão do lugar e nenhuma decoração. Os bares funcionavam em esquema precário e ainda tinha o calor, o empurra-empurra... Em outras palavras: a Main Party foi uma máquina de fazer dinheiro fácil. Ou somos nós brasileiros os mal-acostumados a produções caprichadas.
Uó2: totalmente desnecessários os tais live acts. Botar uma cantora fazendo pose de diva e tentando se conectar com o "lado espiritualizado das bichas" é algo anos 90 demais para minha cabeça (pode ser Ultra Naté, Amannda ou quem quer que seja). E aquele mestre-de-cerimônias (?) com roupa branca de garçom (sim, de gravata-borboleta e tudo!) "animando a galera", dizendo "are you reeeaaaady???" e "let's have a good time Barcelonaaaa!!" chegava a ser constrangedor.
Nota deste blog: 8,0 e olhe lá

5) SOUVENIR
Quando: domingo, 10 de agosto de 2008, a partir das 6h
Onde: Souvenir, Viladecans
DJs: Phil Romano (IT), Hector Fonseca (NY), Enrico Arghentini (IT) e Sens Division (FR); Elias (FR) e Nicolas Nucci (FR)
O que: desde sua abertura em 2001, numa ruela afastada no caminho para o aeroporto, o Souvenir é o principal afterhours de Barcelona e um dos melhores de toda a Europa. A pista principal, retangular, é mais ou menos como a da Blue Space (mas mais escura), com uma parede de bolas que mudam de cor no fundo; há uma segunda pista, menor, no subsolo. A clientela costuma ser variada, como nas melhores noites de Ibiza, mas aquele era um fim-de-semana atípico. Com o Circuit Festival, alguns dos homens gays mais bonitos da Europa estavam na cidade - e todos eles saíram da Main Party com um fogo incrível, direto para a Souvenir. Resultado? Bafo, né. O melhor bafo de todos.
Uau1: o clima daquele lugar é indescritível. É uma atmosfera de hedonismo, luxúria, devaneio. É como um universo paralelo que se abre, um Mundo de Marlboro povoado pelos caras mais lindos, mais interessantes, de todas as partes, num clima de total perdição. Lembrei do quanto eu ficava maravilhado nos áureos tempos da X-Demente na Fundição Progresso e me surpreendi por estar vivendo uma sensação parecida oito anos depois, tendo vivido e passado por tanta coisa. Se a X foi a graduação e a The Week foi a pós, o Souvenir é o MBA. Em Harvard.
Uau2: Corpos perfeitos, sozinhos, não movem moinhos. A noite gay do eixo Rio-SP está cheia deles. Para que se crie um clima de magia, é preciso que exista uma música adequada, que ajude a criar e embalar essa viagem. Talvez esteja aí o diferencial da Souvenir. A música estava muito, muito, muito boa. Os DJs mandaram um tech house bem gay, viajante e extremamente sensual. Era difícil não se entregar, não se deixar levar. Quando eu não agüentava o calor e ia tomar uma água no bar da pista 2, que ficava na pista de baixo, me surpreendia com um som igualmente maravilhoso, bem progressivo, acolhedor. Queria tanto que nossos DJs estivessem lá comigo e vissem que é possível agradar aos gays (inclusive as barbies) com outras sonoridades que não o tribal surrado de sempre!
Uó: Apesar de todos esses predicados, temos que lembrar que o Souvenir é um simples after e não um megaclube. Como era de se esperar, a fila na porta foi dramática; lá dentro, até metade da manhã, a pista principal estava um aperto só. Era um tal de abanar os leques do Gaydar e tirar par-ou-ímpar para ver quem ia comprar a próxima água... Porém, se a queixa do calor e da lotação também esteve presente em outras festas, aqui ela foi plenamente recompensada. Não sei como teria sido sem o fluxo de turistas do Circuit Festival, mas, pela experiência que eu tive nesse domingo, posso afirmar que o Souvenir é o melhor after gay em que estive em toda a minha vida.
Nota deste blog: 10,0 com louvor

COMENTÁRIO: Em seu primeiro ano, o Circuit Festival já pegou. O público realmente acreditou na idéia e Barcelona recebeu gente de todos os cantos, inclusive do Brasil. Em termos de estrutura, muitas vezes as nossas festas são melhores (sabemos fazê-las muito bem quando queremos). Mas o Circuit tem seus diferenciais. O maior deles: as pessoas. Sou orgulhoso da minha nacionalidade e não babo ovo para os europeus, mas acho delicioso e enriquecedor poder conhecer homens de tantos outros lugares: holandeses, franceses, israelenses, espanhóis, italianos. Além de muitos serem lindos de verdade, em geral eles são mais liberais, mais bem-resolvidos em relação a uma série de tabus. E bastante receptivos com os brasileiros. É ótimo estar entre eles e aproveitar, com muito ou pouco juízo. E tem também Barcelona, que é um caso à parte, minha cidade preferida na Europa, que eu recomendo para todo mundo. O Circuit Festival não é absolutamente insubstituível, como nenhuma festa o é. Mas, para quem se interessa por esse tipo de jogação e tem a possibilidade de viajar, fica a dica: fiquem de olho no Circuit em 2009.

11 comentários:

Discípulo disse...

Uma aula! Não só deu suas opniões, mas tb ensinou pra todo mundo a olhar e criticar eventos desta natureza! Este post é mais um grande presente pra cultura gay brasileira! *Adooorei*!

Unknown disse...

Gente.. isso fez a Parada Gay de Amsterdã ficar no chinelo europeu!!!

Beijão Thi!

Anônimo disse...

Fala Thi!

Liguei pra vc essa semana, achei que a temporada já tinha acabado. Realmente ótimo Post. Me parece ter sido incrível, mas realmente, só o Souvenir que me brilhou os olhos... AMO after, não adianta! Na Europa então que todo mundo larga as defesas em dois segundos... melhor ainda.

Bom, boa viajem de volta.

Bjs,

Gustavo C. de Sá Mazzutti disse...

Olá, sou leitor de seu blog... e pena nao nos conhecermos... pois vivo em bcn.
bacana o post, mas nao entendi seu ponto de vista;

qdo a festa bomba de gente guapa, o ambiente tem ar, moderno, sound ok, luz, ela está ruim é inadequada. Hum hein cuma ?!?!

qdo a festa é um a dayparty ou seja outra vibe, organizada com gente bonita quase 4 mil europeus e no limite. Está ruim tbm. Hum hein cuma ?!?!

um poko antagonico e sem nexo este conceito.
abs

Marcao disse...

Sabe 'desnecessário' ?
É o que achei do pocket show com François e Cia na Main Party.
Abraço
Marcao

Thiago Lasco disse...

Gustavo: Oi Gustavo! Que sortudo você por morar aí em Barcelona, hein? Já estou com saudades...

Vc disse que não entendeu meu ponto de vista, vamos ver se eu ajudo. O que eu fiz no texto foi ressaltar o lado bom e o lado ruim de cada uma das festas em que estive. Uma mesma festa pode ter aspectos positivos (gente linda, música boa) e negativos (calor, lotação). Por isso mesmo eu separo o que gosto e o que não gosto, assim consigo ser mais justo, até para as pessoas saberem por que eu gostei ou não gostei daquela noite. Não vejo nenhuma contradição nisso.

Em geral, eu me diverti bastante e, tirando a noite de terça, dei notas boas para todas as festas. Apontei alguns defeitos sim, porque achei importante, especialmente para os brasileiros pararem de idealizar que tudo o que vem de fora é perfeito e tudo o que fazemos aqui é inferior.

De qq forma, obrigado pelo comment! Fiquei feliz em saber que tenho um leitor em Barcelona. Ainda vou falar mais sobre a cidade...

Marcao: O show não atrapalhou a festa e nem impediu quem queria continuar dançando o fizesse. Eu particularmente gostei, e as pessoas que estavam em volta também reagiram bem. Mas concordo com vc que a festa teria passado da mesma forma sem ele!

Rob disse...

Thi to esperando meu email com os bafons de berlin to indo mes que vem ou me adiciona no NSM betoboysp@hotmail.com

Gui disse...

Gatoh, já vi que bapho foi forte meeeesmo. Vai demorar pra total recuperação...rs
Beijos

CARIOCA VIRTUAL disse...

Hey Thiago! Estamos com saudades de vc! Aliás, comentamos sobre isto este fds. Saudades de vc, do marquinho e do xande, claro!

Qto ao post, faço as palavras do Uomini, as minhas: uma perfeita aula de critica! e deixou aquela vontade de me jogar por lá! A F... é que o maridão aqui - vc conhece - só ia querer me acompanhar em 1 ou 2, o resto seria passeio turistico mesmo, ai eu ficaria indo sozinho a estas festas cheias de homens tentadores... hehehe

bjs

Anônimo disse...

ÁPICES DE DESLUMBRAMENTOS!!!!!

Anônimo disse...

Curiosamente fomos às mesmas festas! Concordo com suas opinioes e também acho que o grande diferencial das baladas de BCN é a música, e isso, para pessoas que curtem como nós, é decisivo. A Souvenir é foda. Só quem já foi entende a magia que tem aquele lugar. Ainda assim, se eu tivesse que fazer um panorama de todas as jogaçoes, meu destaque seria mesmo a Space of Sound de Madrid. Aquilo sim é excelência em produçao, em som e entretenimento. E o banheiro? Afff... Ápice de deslumbramentos!... rs... Xande