quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Efeito cardume

Depois de uma semana massacrante, resolvi aproveitar o sol do último domingo para curtir São Paulo de uma das minhas formas preferidas: sobre duas rodas. Mas desta vez não fui sozinho. Fui ao encontro dos SP Gay Bikers, que se reúnem todo domingo (quando não chove) numa frutaria no final da Paulista, de onde saem por diferentes regiões da cidade [mais detalhes no blog deles]. Eu já sabia da existência do grupo havia um tempão, tanto por matérias publicadas nos portais de informação LGBT como por um amigo que era frequentador, mas nunca tinha pintado a oportunidade certa para ir conhecê-lo. O horário era meio puxado (para estar às 10h no ponto de encontro, com tranquilidade, eu teria que sair de minha casa na Vila Olímpia perto das 9 da manhã, num domingo, o que era inviável depois de um sábado de balada). Como estou numa fase mais focada nas obrigações e menos nas jogações, não foi tão difícil chegar lá na hora marcada.

Antes de mais nada, os SPGB são "gente como a gente". Em dois sentidos. Primeiro: o perfil dos frequentadores não é tão "temático" como o nome do grupo pode fazer alguns imaginarem. Ninguém pedala montado, nem vestido com camisetas e acessórios com as cores do arco-íris, como se estivesse indo à parada gay. Segundo: não são atletas, com caríssimas magrelas de corrida olímpica, mas ciclistas amadores, no sentido da palavra. Gente comum mesmo. Alguns mais empolgados usam roupas próprias para o esporte, mas a maioria só vai de capacete (o uso do equipamento é a única condição exigida para pedalar com o grupo). O tipo de gente que tem uma vida normal, rala durante a semana e aproveita o domingão para se exercitar. Uns até fazem outras atividades físicas, mas não é um grupo em que corpos sarados estejam em evidência.

Um dos organizadores me contou que, na época em que os portais divulgavam as atividades do SPGB, o grupo recebia um número maior de curiosos. Enquanto alguns estavam realmente interessados em andar de bicicleta, outros pareciam ter ido apenas para ver se descolavam outro tipo de diversão, se é que vocês me entendem. Algumas matérias, como a que foi publicada na revista Junior, endossavam essa fantasia, alimentando o fetiche em torno dos ciclistas como machos esportistas. Bem, as pessoas que frequentam o SPGB parecem ser muito dispostas, imagino que todas gostem de sexo e muitas estejam em busca até de algo mais sério (no fundo, todo mundo está, não é o que dizem?), mas certamente o propósito fundamental de estar ali não é fazer pegação.

A ideia principal, isso sim, é conhecer gente nova e fazer amizades, de um jeito saudável. E isso rola de forma muito gostosa e espontânea. O pessoal do SPGB é muito simpático, receptivo e acessível. Cheguei ali sem lenço nem documento, eu e meu capacete multicolorido, e não tive dificuldades para interagir. O mais interessante é que dá pra bater muito papo durante o passeio, e não apenas nas paradas. Por ser uma manhã de domingo, o trânsito de carros é bem mais tranquilo, então em vários trechos do percurso os ciclistas pedalam em filas de dois. Você vai naturalmente emparelhando ora com um, ora com outro, e na metade do caminho já conversou com praticamente todo mundo. Tudo num clima super leve. Tem gente mais velha e mais nova, gente que sai e que não sai, homens e mulheres. Uma ótima maneira de sair um pouco das panelinhas de sempre e tomar novos ares.

Outra coisa muito bacana, que senti na pele, foi o que eles chamam de "efeito cardume". O fato de estar pedalando dentro de um grupo faz toda a diferença: uns protegem os outros, os carros dão passagem e respeitam, abre-se a possibilidade de ocupar muito mais espaços, com segurança. Ganha-se visibilidade e legitimidade, enfim. Não dá para deixar de fazer um paralelo com a questão dos direitos LGBT. Separados, somos poucos e somos engolidos pela multidão; juntos, nós podemos muito mais.

20 comentários:

Daniel Cassus disse...

O Rio bem que podia ter algo parecido. Aliás, sinto falta de eventos que reúnam gays que não sejam voltados para pegação.

Adorei a conclusão final.

Anônimo disse...

Sabia que iria gostar...beijão !
PP

K. disse...

Eu e mais um amigo falamos sempre de ir pedalar, mas sempre rola uma preguiça enorme... E eu até agora não sei se me sentiria seguro. SP parece um amontoado de motoristas kamikazes!

Fiquei com mais vontade!

Wans disse...

É bacana quando somos pegos por algo que nem imaginávamos ser tão satisfatório. Fico feliz pelsa sua conquista e pela sua disposição, pois sair da Viola Olímpia para pedalar nãod eve ser fácil

bj

Thiago Lasco disse...

Daniel: quer a gente queira, quer não, tudo que é pensado para o gay ainda passa muito pelo sexo. Tem gente - como o colega Uomini - que inclusive sustenta que não há como ser diferente, que é da nossa natureza e tal. Será?

K.: É por isso que os passeios rolam nas manhãs de domingo. A cidade está muito mais calma e, acredite, dá para passear com bastante segurança. E tem também a segurança extra de estar em grupo. Isso faz uma diferença enorme.

Wans: Olha, a Vila Olímpia nem é tão longe assim. O que mata mesmo é que, para chegar na Paulista, é preciso subir os Jardins por algum lugar, não tem como evitar essa subida. Seja pelo Paraíso, seja pela Brigadeiro, seja pela 9 de Julho, seja pela Rebouças, seja por dentro. Eu fiz um caminho ninja com o menor desgaste possível, mas ainda assim cheguei meio esbaforido. O lance é só ter um mínimo de condicionamento físico... ;)

TONY GOES disse...

Fato: eu não sei andar de bicicleta.

Não espalha.

Antonio disse...

Tava esperando ha tempos por este momento!!! :D
Que bom que gostou thi, fico bem feliz!!! e a sua adesao so ajuda a galera a participar e a fortalecer o grupo, afinal esse blog tem todo um star-quality..:D
peninha de estar longe...mas estou bem onde estou..kkkk
bjos querido!

Daniel Cassus disse...

Bom, a sexualidade é a única coisa que nos diferencia dos héteros. Mas parece que quande se fala em gay, se esquece que somos seres humanos como quaisquer outros e fazemos outras coisas além de sexo (oh! surpresa!). Eu li o texto do uomini, mas não concordo. Apesar de termos a sexualidade em comum, não siginifica que temos que nos reunir em torno dela.

Unknown disse...

Thiago!

muito legal teu texto, espero o ver novamente pedalando conosco!
é sempre uma delicia compartilhar ideias, atitudes saudáveis e especialmente muito carinho.
bom fds
celso

Lucas disse...

Tiago (ou é Thiago? - nunca sei), o Uomini é viciado em sexo, fato.

Eu ia comentar isso no último post-rompante dele criticando a fábula do "casalzinho 20" mas preferi falar aqui mesmo.

Anyways, Uomini, caso leia, sou o Lucas que tem um beck no avatar com "Grass" escrito em cima.

;)

Fernando Gouvea disse...

Muito interesante esse movimento, inprescindível essa união e andar de bicicleta junto deve ser um exelente começo. Aqui no rio a Body Tech faz esses encontros de vez em quando, é legal, mas um encontro de bikers gay deve ser muito bom.
Abraço

Lobo disse...

Eu juro que eu tenho medo do que a cacocleta poderia fazer com tanto ciclista junto...

Seria legal se por aqui pelo Rio ou Nikit tivesse algo parecido. Arriscar pedalar por essas ruas sozinho sem ser entre 10 da noite e 6 da manhã é suicídio...

Don Diego De La Vega disse...

Vc não mencionou se aguentou todo o percurso...é puxado pra quem não faz aeróbico ou faz pouco? Tem gente q larga no meio e vai embora?

Vc vai ficar habitué?

tommie disse...

Tbm gostei do ´efeito cardume´. E tem algo que me intriga mais do que se gays só pensam em sexo, e não sei se acho bom, saudável, ruim, perverso: o deboche que gays fazem com gays. Acredito no ´poder´ do humor, mas tbm acredito que baixa autoestima é fábrica de ódio pelo igual.

Thiago Lasco disse...

Don Diego de La Vega: Tem muita gente ali que parece ser meio 'atleta de fim de semana', então a ideia é sempre fazer algum percurso que consiga ser suportado por todos, sem excluir ninguém, ou fazer que largue pelo caminho. O grupo tem uma grande população 'flutuante', que não aparece sempre, e no domingo passado havia gente 'não-iniciada', então rolou essa preocupação de fazer algo mais light.

Achei bem tranquilo, apesar de sempre acabar tendo algum trechinho de subida (numa cidade pouco plana como SP). O trabalho aeróbico acabou valendo mais pela duração (foram umas três horas, com as paradas) do que pela intensidade.

Thiago Lasco disse...

Ah sim: não tenho como ir todos os domingos, porque eu conto muito com esse dia para fazer um treino mais longo de musculação na academia, já que os meus horários na semana são puxados. Mas pretendo tentar ir tipo 1x por mês. Vamos ver...

Gilberto Scofield Jr. disse...

Gay bike groups em SP? No, thanks. Aliás, em lugar nenhum. #horroratiastella // Vc tá bem?

Antonio de Castro disse...

se eu soubesse andar de bicicleta.

Luciano disse...

Acho um barato este tipo de programa, deveria ser bastante incentivado. Muito bacana um encontro motivado por participantes gays que não seja para fazer algo diretamente relacionado com a sexualidade.
Abraço,
Muque de Peão

railer disse...

concordo com o daniel, aqui no rio não vejo nada nesse sentido.