segunda-feira, 7 de maio de 2007

Você precisa da bênção do Papa?

Às vésperas de sua chegada ao Brasil para uma visita de cinco dias, a figura do Papa Bento XVI é assunto constante na ordem do dia. Enquanto beatas em polvorosa se preparam para sair em romaria até Aparecida (que, justo nessa hora, está prestes a declarar estado de emergência por conta de uma epidemia de dengue), vários setores da nossa sociedade estão perplexos com as declarações que o Sumo Pontífice tem feito mundo afora, condenando o uso de preservativos, o aborto, o divórcio e a homossexualidade. Os movimentos homossexuais, em particular, preparam uma série de manifestações de repúdio – o Grupo Gay da Bahia, por exemplo, já avisou que vai queimar fotos de Bento XVI em frente à Catedral da Sé, em Salvador.

Francamente, não entendo o motivo de tanto espanto e indignação. O que as pessoas esperavam do Papa? Ele está apenas sendo coerente com os princípios da religião da qual ele é o expoente máximo no mundo. Eu ficaria surpreso, isso sim, se de repente ele passasse a relativizar os dogmas do catolicismo em busca de mais fiéis, dizendo que não é bem assim, que hoje em dia as coisas mudaram. Isso sim seria patético, uma prova cabal de que o Vaticano está mesmo tão preocupado com a evasão das massas para outras religiões que precisa negociar valores que sempre defendeu como absolutos.

O brasileiro acha que existe jeitinho para tudo e quer customizar a religião conforme suas necessidades práticas. Cresceu ouvindo dizer que era “católico” e quer continuar repetindo isso para a pesquisadora do censo do IBGE, mas não gosta de seguir a cartilha e acha ruim quando o Papa lembra dos preceitos que os fiéis devem seguir. Daí vem o desconforto de alguns, que querem continuar pertencendo a um rebanho do qual não enxergam que já se desprenderam há muito tempo, porque em sua vida real simplesmente não praticam esses valores.

É verdade que os tais valores da Igreja Católica foram cunhados para sustentar a dominação ideológica dos fiéis no passado e estão em total desacordo com os anseios da humanidade do século 21. Que afirmam que o homem já nasce pecador e deve passar a vida tentando limpar sua ficha e implorando por perdão. Que não concebem a camisinha, o aborto ou a homossexualidade porque acreditam piamente que o sexo não tem nenhum sentido que não seja para a perpetuação da espécie. Esses valores podem ser um disparate para mim ou para você, mas essa é a visão de mundo deles; o catolicismo não evolui com o homem, o homem é que deve evoluir, se for o caso, para religiões que proponham um olhar mais real sobre a vida. Cada um na sua com aquilo em que acredita.

E tem mais: o papel da Igreja Católica não é ser condescendente com ninguém. De boazinha, ela nunca teve nada. Se a população tivesse prestado mais atenção nas aulas de História que teve no colégio, lembraria que a Igreja Católica foi desde o início uma instituição centralizadora de poder e perpetuadora de desigualdades sociais, e esteve sempre muito mais comprometida com a manutenção dos próprios privilégios do que com a promoção dos valores humanitários que ela alega defender. Da cobrança do dízimo à iniciação sexual compulsória de jovens seminaristas por padres pedófilos (Almodóvar não me deixa mentir), não faltam exemplos de que a Igreja pode ser tudo, menos santa.

Portanto, ao invés de se estressar porque Bento XVI disse as mesmas ladainhas que a Igreja Católica sempre disse e sempre continuará dizendo, as pessoas deveriam questionar qual o peso que a palavra do Papa deveria ter em suas vidas hoje. Os gays, em especial, precisam aprender a viver suas vidas sem ter que ficar pedindo o aval do Papa ou de quem quer que seja. Se o beijo gay não saiu na novela das oito porque a sociedade média não aprovou, isso não deveria significar mais nada a não ser o fato de que as pessoas sempre terão crenças diferentes, e devem ser felizes com as suas próprias sem que os outros também precisem estar convencidos delas.

5 comentários:

Anônimo disse...

Fofo,
Parabens!!
QUASE impecavel, se nao fosse o ultimo paragrafo.
FXXXX

Gui Sillva disse...

Ótimo texto, Thiago.

Só pelo 3 simples pedidos: que a passagem deste homem não demore muito; que ele não "solte" as belíssimas pérolas de sempre (ninguém merece ouvir, nem mesmo os beatos) e que os meios de comunicação não nos enfie guela abaixo notícias sobre o pontífice.

Grande abraço.
Ahhhh, neste momento ele já deve estar no Brasil. Ou melhor, em SP. Sorte de vocês!
hahahahahahhahahahahahahha

Discípulo disse...

Thi,
1)A revista Piauí deste mês tá muito boa (e olha que, desde as primeiras, eles não fazem feio!)
2)Se puder, visite o Largo de São Bento durante a estada do papa: é encontrar um centro realmente renovado e digno de São Paulo... mas não pode ir pra muito longe dali :)...
Bjão
Cris

I. disse...

Criança, vc está na carreira certa. Complemento, a respeito das peculiaridades religiosas do nosso país, lembrando do famoso sincretismo. Nasce-se, casa-se e morre-se na Igreja, mas apela-se pras macumbinhas, pras cartomantes e simpatias!

Beijo!

Gui disse...

O Brasil é peculiar porque sempre foi assim...desde sempre somos essa mistura de crenças, com menos preconceito nesse ponto.

Hoje vi tres velhinhas conversando na rua sobre aborto e métodos de evitar gravidez de jovens. Estamos evoluindo!

Eu fui criado em igreja catolica, batizado, fiz catecismo e crisma, rezo pros santos e pro Deus dessa igreja, mas nem por isso concordo com tudo o que ela diz. Ou ela não concorda com tudo o que eu digo... sei lá.